sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Técnicas de Ensino do Voleibol

Pedagogia do exercício - Repetir exercícios - Educação do comportamento emocional - Treinar com qualidade - Progressos e novas exigências - Aperfeiçoamento técnico - Esforço e satisfação.

Pedagogia do exercício (para qualquer desporto)
No Brasil, e penso que em muitos países, o ensino de qualquer desporto continua encontrando as mesmas dificuldades de outrora, isto é, sabe-se mais a respeito das técnicas de execução dos gestos, das táticas a empregar, de quase todos os ingredientes científicos, mas pouca atenção se dá – diria que nenhuma – aos primeiros aspectos da formação dos futuros praticantes. Defino “futuro praticantes” aqueles indivíduos de pouca idade que se propõem a aprender algum tipo de esporte para o seu lazer e, quiçá, até como profissão.
Repetir exercícios
Em voleibol, como em qualquer outro desporto, o embasamento teórico está voltado para que as respectivas técnicas de execução dos gestos – as habilidades motoras específicas – devem ser aprendidas, aperfeiçoadas e exaustivamente treinadas. Entretanto, essas habilidades motoras atuam em consonância com uma outra componente, a educação dos sentimentos ou do comportamento emocional.
Educação do comportamento emocional
“Educar sempre significa mudar”. Se não houvesse nada para mudar não haveria nada para educar. Que mudanças educativas devem realizar-se nos sentimentos? Todo sentimento é um mecanismo de reação, ou seja, é certa resposta do organismo a algum estímulo do meio. Logo, o mecanismo de educação dos sentimentos é, em linhas gerais, o mesmo para todas as demais reações. Estabelecendo estímulos diversos sempre podemos fechar novos vínculos entre a reação emocional e algum elemento do meio. A primeira ação educativa será a mudança daqueles estímulos com os quais está vinculada a reação. Qualquer pessoa sabe que o que nos causa medo na infância não nos causa depois. Aquilo que provocava pavor e assustava deixa de ser perigoso. (Vygotsky)
Treinar com qualidade
Pode ocorrer que o que se está propondo fazer não é o melhor para o indivíduo, invariavelmente, um padrão de comportamentos estereotipados, “receitas técnicas”, ou como dizemos por aqui, “receitas de bolo”. Quase sempre não há diálogo entre professor e aluno, o que acarreta uma simples imposição dos exercícios, tornando uma repetição cansativa que invariavelmente leva ao cansaço e ao descaso. Despertar o interesse do indivíduo por uma tarefa é torná-lo corresponsável por ela, senão o único a executá-la, corrigir-se até que atinja a perfeita técnica da sua execução. Este deve ser o seu objetivo e prêmio: aperfeiçoar-se e descobrir novos desafios. Assim, treinar com nível de exigência definido e acessível é diferente de “repetir exercícios”, onde o nível de exigência é quase sempre relegado. Destacam-se dois aspectos:
- O indivíduo não é levado a pensar para decidir sobre a nova situação.
- Sendo repetitivos, tornam-se exaustivos.
Progressos e novas exigências
Isto tem um significado pedagógico: todo caso de plena satisfação com os resultados acarreta certas mudanças no mecanismo nervoso da adaptação. Sugere que apenas uma simples repetição ainda não assegura o momento do êxito, uma vez que só a execução “bem sucedida” de alguma ação propicia a formação da organização desejável no sistema nervoso central. Se o mesmo movimento se repete a cada instante, a exaustão leva a resultados insatisfatórios que impedem diretamente a formação de novos caminhos de menor resistência. Este pequeno grande detalhe nos leva a tergiversações infindáveis. Todos já devem ter assistido em cursos ou treinamentos de adultos a aplicação de inumeráveis exercícios objetivando este ou aquele elemento do jogo, implicando um ou mais jogadores, numa sequência às vezes variada de movimentos repetitivos. Por exemplo, assistindo um dos treinos de seleção brasileira (não me recordo o ano), analisei a sua construção e o seu objetivo. Era um treino de defesa individualizado para jogadores que, invariavelmente, ocupam a mesma posição ou área da quadra (I e II). No caso em questão tratava-se de atletas especialistas em ataques de “saída de rede”. Eram dois que se revezavam a cada ciclo de cortadas produzidas por três auxiliares situados no outro campo, posicionados sobre uma mesa; cada um deles nas posições de ataque convencionais. Invariavelmente, os “ataques” se sucediam em profusão, mas em constante monotonia, o que me pareceu comprometer a validade (qualidade) dos exercícios. Acertos ou erros, especialmente estes, não tinham o necessário diálogo entre treinador e atleta. Assim, cumpriu-se o ritual do treinamento, mas não creio que aqueles dois indivíduos tenham acrescentado qualquer aspecto de desenvolvimento no quesito defesa. Mas saíram bem cansados e, pior, certamente teriam que repetir a mesma coisa nos dias seguintes. A meu ver, não acrescentaram nada ao seu cabedal técnico que, com certeza, não incluía saber defender. Lembrei-me do saudoso Adolfo Guilherme (Minas T. C.), que em 1966 à beira da piscina do Grêmio Náutico União, de Porto Alegre, me dizia após nosso jogo pelo campeonato de clubes campeões: “Não sei o que vocês de Niterói fazem (treinos), mas sempre encontramos muitas dificuldades para levá-los de vencida; como defendem”! Uma de nossas vantagens sabia ele, é que atuávamos impreterivelmente duas vezes na semana no voleibol de praia de forma descontraída e moleque.
Esforço e satisfação
Num dos capítulos consagrados aos exercícios, Vygotsky analisa o tema em epígrafe e indica uma das regras psicológicas de importância: o exercício só é plenamente bem sucedido quando acompanhado de uma satisfação interior. E vai além, afirmando que de outro modo se transformaria numa cansativa repetição, contra a qual se rebela o organismo. Em suma, “o esforço coroado de êxito, eis a condição mais importante para se avançar”.
Nas minhas práticas foi assim que procedi ao construir meus exercícios quando treinava solitariamente: tinha-os como verdadeiros desafios a serem conquistados com muita obstinação e esforço, plenamente recompensados. Nos treinamentos que realizei no América F. C., no Rio de Janeiro, e na Praia de Icaraí quando treinava atletas de Vôlei de Praia, imagino ter sido os momentos mais criativos de minha carreira de treinador. Exigia individualmente o cumprimento de todas as fases do exercício, especialmente o “ritmo”, o que importava em repetição desde o início se houvesse algum deslize no seu desenvolvimento. E, detalhe, os companheiros não envolvidos acompanhavam toda a execução, apoiando e incentivando. Os exercícios tinham verdadeira produção teatral, ricos em plasticidade e descontração, traduzidas na alegria e satisfação dos indivíduos, inclusive, gerando plateia. Há alguns anos encontrei-me com um deles (em 1981 tinha 18 anos), que me agraciou com uma declaração demasiadamente generosa ao apresentar-me ao amigo: “Este foi o melhor e maior técnico que já tive”. Valeu a pena! Creio que na fase adulta de sua vida deve estar colocando em prática tudo que emocionalmente vivenciou naqueles tempos. Este é o verdadeiro campeão que buscamos!
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A seguir estarei comentando alguns temas pouco abordados e, por isso, bastante difíceis. Creio que ao compartilhar, opinar, sugerir temas, todos poderemos nos locupletar. Vejam algumas proposições e, se for o caso, coloque o assunto do seu interesse imediato: 1) Será que certas tentativas de ensinar as crianças fracassam porque as técnicas de ensino utilizadas são fracas? 2) Como avaliar a qualidade dos estilos de ensino utilizados? 3) Que critério usaremos para caracterizar o sucesso? 4) Como definir a instrução eficaz? 5) Como e quando as crianças generalizam o que lhes é ensinado, aplicando-o a outros problemas?
Aguardem.

3 comentários:

  1. Como sempre, seu texto está ótimo. Os professores que lerem e aplicarem o que você ensina vão ter excelentes resultados, com certeza. Feliz Natal. Arlindo Lopes Corrêa

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  2. Parabéns professor seus textos realmente possui um conteúdo que realmente veio da prática, aos poucos vou conseguindo ler seus textos... Recentemente tivemos aqui em Franca-SP, uma formação ministrada pelo professor Alcides Scaglia, um discipulo do prof. João Batista Freire da Unicamp, que possui um estudo do "Jogo" da forma como vc cita, no caso dele ele coloca como "jogo trabalho", o jogo sem perder seu carater lúdico..., na prática eu pessoalmente ainda não consegui explorar muito este tipo de jogo, necessito muito aprender a conduzir o jogo com esta finalidade.
    Feliz Natal.Leandro Batista

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  3. Arlindo, sua presença constante e seus incentivos me envaidecem. É bom tê-lo por perto.
    Leandro, fico feliz por seu contato. Percebo que necessita de informações sobre como conduzir as práticas com seus alunos. Mantenha contato que lhe darei as dicas pertinentes.
    A ambos retribuo com muito carinho os votos de um Feliz Natal e que Deus abençoe seus lares. Roberto Pimentel.

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