sábado, 31 de outubro de 2009

Escola, universidade, clube




Escola
Nosso sistema educacional ampliou o seu atendimento, mas pouco evoluiu do ponto de vista qualitativo. Continua produzindo alunos despreparados, que em todos os testes internacionais sempre colocam o Brasil nas últimas colocações. Mas seria diferente caso os estudantes recebessem qualidade e habilidades nos conhecimentos, o que incluiria a garantia de durabilidade. O esporte, do ponto de vista educacional, pode alavancar procedimentos bastante eficazes, inclusive solucionando outro problema crônico, a participação efetiva de agentes educadores da comunidade.
Multieducação - Em 1994, apresentei projeto à Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, cuja avaliação transcrevo a seguir. Não foi concretizado devido a problemas políticos: “Projeto interessante, rico pedagogicamente, que se coaduna com o Núcleo Curricular Básico Multieducação. A atividade básica é a prática do voleibol de uma forma mais lúdica. Neste sentido, há o favorecimento da participação de todas as crianças, não havendo uma submissão rígida à forma técnica do desporto, possibilitando-se assim a participação, independente da habilidade individual de cada indivíduo. Em suma, trata-se de atividade agregadora, cuja metodologia pode ser estendida a outros esportes”.
A Educação é sabidamente resistente à mudança e à inovação talvez por sua relutância em abrir-se à participação multidisciplinar. O setor geralmente é monopólio de poucos e um despertar de novas ideias é visto como uma invasão e, portanto, ameaça perigosa a direitos natos. Foi assim quando realizei minhas incursões em escolas e universidades. Proponho neste espaço democrático – a internet – a ampliação da discussão pedagógica visando à integração de linguagens que sintonizam todos com o tempo em que vivemos. É chegado o momento deste grande salto, faltam apenas criatividade e determinação. Vamos começar?
Questões metodológicas - Limitar o aprendizado de um esporte por repetição de modelos, decorar gestos ou movimentos prontos, não determina proficiência em esporte algum. Estaríamos adestrando e não estimulando o aprendizado. A lógica da criança não é a lógica do adulto. Construir os conceitos sobre um assunto compreendê-lo e agir sobre ele é, antes de tudo, anterior à etapa da verbalização. Ler e escrever, p.ex., são habilidades nas quais nos aperfeiçoamos bem depois da fluência oral.
Prática... No colégio devemos oportunizar a prática desportiva como recreativa. Assim, nos momentos vagos, nos recreios, os alunos poderão jogar e se divertir segundo as próprias regras. É desnecessária a presença do adulto. Além do que contribui para a prevenção da violência dentro da própria escola. O exemplo maior vem do Colégio Salesianos de Niterói.
Universidade – Em dez./2000 produzi demonstração do método na Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, cujo catedrático era o Professor e Mestre Luís Washington Cancela, meu companheiro de vôlei do Botafogo em 1973. A aula teve duração de 75 min, contou com a participação dos 45 alunos do Curso de Educação Física. A quadra oficial de vôlei foi dividida em três miniquadras e empregado farto material além de 24 bolas. Após o evento foi realizada uma avaliação da aula. Eram três temas dissertativos: atividades e destaques, metodologia e aspectos positivos/negativos. Eis o resumo: I – Atividades e destaques. Foram atribuídos pontos para os exercícios: Paraquedas (144 pontos); Tamancos (144); Biruta (120); Minivôlei (jogo,114); Bolas de tênis (96); Cones (78); Puçás ( 63); Jogo com Panos ( 39).II – Metodologia. “Iniciação com aspectos lúdicos evidenciados, representada por excelente CONVITE à criança. CRIATIVIDADE e PLASTICIDADE, aula rica em ideias, movimentação e material”.III – Aspectos: a) positivos - ludicidade, organização, dinâmica, motivação dos alunos; o jogo propriamente (minivôlei) e a riqueza do material; b) negativos - alunos sentados durante algum tempo (fora da aula). Obs: Cinco alunos foram dispensados da aula por impossibilidade física. Deve-se entender que o fato de não participarem frustrou-os dada a motivação de seus colegas.
Conclusão – A intenção foi conduzir o leitor para algumas observações vivenciáveis e que a maioria dos professores nas escolas trata como “problema” e os treinadores (nos clubes) brasileiros não conhecem. Percebam que a mesma aula pode ser realizada tanto na escola como no clube, independente do número de praticantes. O fator principal em ambos os casos reside na qualificação do professor, o material a empregar e na escolha da metodologia. Fala-se muito em problemas, dificuldades etc., mas nenhuma solução. Creio que encontrei uma delas. Por que não buscar outras?
Boa leitura. “O princípio básico da metodologia desenvolvida centra-se em como propor uma atividade à criança de forma que ela se sinta estimulada e desafiada, em constante interação, fazendo do esporte uma ferramenta útil às suas necessidades e desejos. Construir o vôlei (ou qualquer outro desporto) de forma eficaz, criativa e lúdica é, pois, a tarefa primordial do especialista ao se tratar de ensino do esporte. Entender como o pensamento se desenvolve desde o nascimento, entender que a criança fala porque pensa e não pensa porque fala, compreender para corresponder satisfatoriamente ao universo que realmente interessa à criança”.
Formação Continuada – Fui convidado a produzir aulas em cursos de atualização para professores em universidades do Rio sobre a Iniciação ao voleibol. No primeiro contato fui informado que seríamos dois os palestrantes e eu poderia fazer do modo como sempre realizei as aulas. Um professor sucederia o outro após breve intervalo de descanso. O interessante foi que percebi que o catedrático executaria as aulas como se estivesse num clube competitivo. Optei, então, em contemplar os colegas com uma boa e teatral exibição do que poderia ser uma aula no colégio. E assim foi. Não vou cansá-los com a descrição, mas, sem falsa modéstia, fui aplaudido pelo grupo ao final.
Em outra oportunidade, o tema foi o marketing no voleibol. Uma aula teórica em que apresentei oportunidades de receita para professores que necessariamente NÃO sabem e NUNCA jogaram uma partida de voleibol. A ênfase faz-se necessária devido ao fato cultural de que “voleibol é muito difícil de ser ensinado”, apregoado até hoje em nossas universidades. Ilustrei o grupo com projetos que vinha realizando na Praia de Icaraí (Niterói) para 400 crianças de 8-13 anos de idade. Por fim, marketing no voleibol me pareceu errôneo, talvez fosse mais apropriado oportunidades.
Atividades inteligentes e criativas - É fundamental que se leve em conta ao se planejar um curso para crianças, a psicologia funcional – interação humana. Saber, por exemplo, que necessidades a criança tenta satisfazer naquele momento da aula. Inicialmente, ela quer jogar ou brincar? O desconhecimento pedagógico pode transformar uma aula numa verdadeira tortura, levando ao trauma, à falta de estímulo, à frustração. Basta consultar o grupo feminino que, na escola, sofreu e se frustou com as aulas de vôlei. Creio que nem o jogo da queimada queiram jogar. E o pior, suas filhas passarão ou passam pelo mesmo desígno. Imagino que cada família tenha mais de um exemplo vivo do que digo.São nos pressupostos interacionistas (interação professor x aluno x aluno) que vamos buscar os elementos de consolidação da aprendizagem, permitindo, através desta interação, a criação de zonas de desenvolvimento proximal no aluno. Neste método, o ponto de partida é a prática social, que é comum a professor e aluno (interação). É neste momento que o professor, através de uma atividade proposta, com um conteúdo específico a ser trabalhado, interagirá com as crianças de tal forma que elas possam interiorizar a teoria através da prática. A partir desta prática social, o professor levantará junto aos alunos os principais problemas detectados: problematização, tendo em vista a instrumentalização que ele fará logo em seguida. O professor poderá pedir aos alunos que pesquisem entrevistas, livros; poderá também transmitir o conhecimento através do vídeo e outros meio que possibilitem a assimilação dos conteúdos.
Vivência. Certa feita, convidei-me e exibi para colegiais o filme sobre o treinamento japonês que levou suas equipes ao pódio olímpico em 1964 e em 1972. E as crianças adoraram minha tradução.
Clube, duelo notável – Um professor realizava treinos regulares para um pequeno grupo de alunas após o horário das aulas seguindo a metodologia que adoto. Um outro, que treinava igualmente grupo na mesma faixa etária, mas visando à formação de equipes para disputa de campeonato de voleibol no Rio de Janeiro, solicitou a realização de uma partida amistosa. Presenciei o jogo e pude retirar bons ensinamentos. As equipes se diferenciavam em todos os aspectos. De um lado, meninas descontraídas, alegres por estarem participando de uma brincadeira que, a cada ponto ou lance feliz, comemoravam com sorrisos e abraços. Do outro, seis meninas que mal se continham em pé, pateticamente abobalhadas, sem qualquer reação e olhos atentos ao treinador (seria adestrador?) como à espera de uma ordem ou assobio para fazer o que? Após a partida, o treinador perguntou: “Como conseguiu que sua equipe vencesse a minha, eu que treino várias vezes por semana, disputo campeonato oficial..."? O professor retrucou com leve sorriso nos lábios: “Pura sorte de principiante”. E saiu sem mais explicações.
Isto me fez lembrar idêntico diálogo em 1981, após uma partida entre as equipes masculinas do América F.C. e do Fluminense F. C. pelo campeonato carioca. Fernandão (vice-campeão olímpico, 1984) era o técnico do Fluminense, que me indagou ao final: “Roberto, não sei o que você fez com a sua equipe, mas se compararmos jogador por jogador, minha equipe é muitas vezes superior à sua. O que está acontecendo”? Deu-me vontade de dizer-lhe: “Pura sorte”!
Ainda neste mesmo ano, após o jogo amistoso que promovi entre o América e o Flamengo, exibi em plena quadra o mesmo filme do voleibol japonês para as equipes e público presente. Foi um sucesso!

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